A capital do Pará sedia de 20 de maio a 29 de junho o Projeto Memória Lélia Gonzalez: Caminhos e Reflexões antirracistas e antissexistas, no Espaço São José Liberto, com atividades diversas que rememoram o legado da professora e ativista mineira.
O painel “A influência de Lélia Gonzales na luta antirracista e antissexista”, nesta terça-feira, 20, às 18h45, aberto ao público, terá como mediadora a cientista social Vanusa Cardoso, mestranda em antropologia, cofundadora do Coletivo Frente em Defesa dos Territórios, coordenadora de políticas para a Igualdade Racial no município de Ananindeua e liderança do território do Abacatal.
O painel a ser mediado por Vanusa tem como convidadas as professoras Jurema Batista e Zélia Amador.
Qual a importância de um evento como o projeto Memória Lélia Gonzalez para o debate antirracista?
Para mim, o Projeto Memória Lélia Gonzalez é um marco no fortalecimento do debate antirracista no Brasil. Resgatar a história e o pensamento de uma mulher negra como Lélia é um ato de justiça, de resistência e de inspiração. Ela nos deixou um legado profundo de reflexão sobre o racismo, o sexismo e a luta por um Brasil mais justo, e isso precisa ser conhecido, discutido e vivido.
Quando participo de eventos como esse, vejo como é potente trazer à tona as vozes que foram silenciadas. A memória de Lélia nos mobiliza a pensar o nosso lugar no mundo, a ocupar espaços de poder, a construir outras narrativas a partir de nossas vivências negras, quilombolas, femininas e amazônidas. Esse tipo de evento é um chamado à ação coletiva.
Lélia era mineira. Como a trajetória dela pode influenciar os cidadãos e cidadãs paraenses?
Mesmo sendo mineira, Lélia falava de uma realidade que também é nossa aqui no Pará: o racismo que estrutura a sociedade, o apagamento da nossa cultura, a exclusão das mulheres negras dos espaços de decisão. A trajetória dela mostra que é possível enfrentar essas barreiras com firmeza, com inteligência, com afeto e com ancestralidade.
Para nós, no Pará, especialmente em comunidades quilombolas como a minha, no Abacatal, a vida e o pensamento de Lélia dialogam diretamente com os desafios que enfrentamos diariamente. Ela valorizava a oralidade, a cultura negra, os saberes populares. Isso tudo está vivo entre nós, nas nossas práticas, na nossa espiritualidade, na nossa forma de cuidar da terra e umas das outras. Lélia nos ensina que pensar e lutar a partir do nosso território é uma forma legítima e poderosa de transformar o mundo.
De que forma você repercute os debates destes eventos na sua comunidade?
Repercutir esses debates é parte do meu compromisso com a minha comunidade. No Quilombo do Abacatal, levo as reflexões para as rodas de conversa, para os encontros com mulheres, para os momentos com a juventude, e também para os textos que escrevo, tanto na minha caminhada como defensora de Direitos Humanos.
Tudo o que aprendo nesses espaços de formação e memória, eu transformo em partilha. Traduzo essas ideias para a nossa realidade, com o nosso jeito de falar, com as nossas referências. E dar visibilidade às nossas histórias, de afirmar que memória é resistência, é identidade viva.
E quando digo “sou uma, mas não sou só”, estou dizendo que caminho com muitas outras. Que minha voz ecoa as vozes de muitas mulheres negras, de muitas quilombolas, de muitas Lílias, Lúcias, Marias e Lélias que resistem, que ensinam e que florescem mesmo em meio ao concreto. É assim que reverbero os debates: com o corpo, com a palavra e com o cuidado de quem sabe que os nossos passos vêm de longe.
Sobre Lélia Gonzalez
Natural de Belo Horizonte, Lélia Gonzalez (1935-1994) foi importante professora, intelectual e ativista do movimento negro. Formou-se em história e geografia e, posteriormente, filosofia, estudou psicanálise, conduziu pesquisas sobre cultura negra e fundou o Movimento Negro Unificado (MNU). Seu ativismo político e produção de saberes contribuíram para a formação do feminismo negro.
O projeto Memória, criado pela Fundação Banco do Brasil, é dedicado a celebrar vida e obra da pensadora mineira.
A programação completa pode ser conferida no site do Projeto Memória:
https://projetoleliagonzalez.com.br/site/
