O Brasil lidera o ranking mundial de transtornos de ansiedade, com 9,3% da população afetada (18 milhões de brasileiros). A depressão atinge quase 6% da população brasileira (11 milhões de brasileiros). É o que aponta o mapeamento global de transtornos mentais, realizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Os transtornos mentais são ainda mais preocupantes em pessoas que enfrentam o diagnóstico de doenças graves como o câncer, pois a incidência é muito grande. “O Janeiro Branco é um momento oportuno para fomentar debates sobre a saúde mental e reduzir o estigma que ainda cerca as doenças emocionais. É uma campanha que incentiva a prevenção e o tratamento adequados”, destaca a psicóloga Natália Rêgo, do Centro de Tratamento Oncológico.
O diagnóstico de câncer afeta a saúde mental de cerca de 50% dos pacientes, segundo o estudo publicado na The Oncologist, revista científica especializada em oncologia da universidade de Oxford, na Inglaterra. A pesquisa aponta que a depressão é de duas a quatro vezes mais comum em pacientes com câncer do que na população em geral.
“Dos pacientes oncológicos que têm a saúde mental afetada por causa do câncer, cerca de 60% sofrem de depressão e ansiedade simultaneamente. A ansiedade é mais frequentemente percebida em pacientes com diagnóstico recente de câncer. Já a depressão é mais comum em pacientes em estágios mais avançados da doença”, explica a psicóloga. “A saúde mental pode ser afetada no momento do diagnóstico, durante o tratamento e até depois, quando o tratamento já foi finalizado”, afirma.
O tratamento do câncer é feito por uma equipe multidisciplinar, para garantir ao paciente o olhar atento e a intervenção de vários profissionais de saúde. Família e amigos também têm um papel fundamental porque o paciente pode estar muito triste, irritado, com medo ou preocupado demais e tudo isso pode dificultar a busca por ajuda. Os familiares devem estar atentos.
Rede de apoio – Ninguém pode enfrentar sozinho uma doença potencialmente grave como é o câncer. Além da equipe de saúde, o paciente precisa de vários tipos de ajuda. Suporte emocional é fundamental, assim como ajuda com questões práticas. O cuidador é quem acompanha o paciente nas consultas, exames e sessões do tratamento, por exemplo.
“O cuidador e outras pessoas da rede de apoio têm que ser empáticas, compreensivas, disponíveis. São pessoas da rede de apoio que vão ajudar a identificar sinais de depressão ou ansiedade, vão interagir e ajudar a equipe de saúde”, explica Natália Rêgo. “Não é missão fácil e os próprios integrantes dessa rede de apoio também precisam estar atentos à sua própria saúde mental. Até porque, mesmo depois de encerrado o tratamento, muitos pacientes continuam lidando com o medo de o câncer voltar”, conclui a psicóloga.
Janeiro Branco – O Janeiro Branco é uma campanha nacional dedicada à promoção da saúde mental e emocional. A iniciativa foi criada em 2014 pelo psicólogo mineiro Leonardo Abrahão, com o objetivo de sensibilizar a população para a importância do bem-estar psicológico e estimular a busca por cuidados especializados quando necessários. O primeiro mês do ano é simbolicamente associado a recomeços, reflexões e novos projetos. A escolha do nome Janeiro Branco remete à ideia de uma folha em branco, incentivando as pessoas a priorizarem a saúde mental.
Gabriela sofreu uma queda no Natal de 2020 e passou a sentir muitas dores lombares. Foi ao médico e nos exames descobriu um tumor renal com 5 cm. Operou em 15 de março, para a retirada do rim direito. Mas outros exames constataram que ela já tinha metástases em alguns lugares, como peritônio e pulmão. Fez 12 sessões de quimioterapia e agora está em acompanhamento.

“Durante esses últimos 4 anos, fiz diversos tratamentos: radioterapia, imunoterapia, quimioterapia oral e a tradicional. O maior desafio da minha vida foi receber esse diagnóstico, para uma menina de 22 anos cheia de planos e muito vaidosa, foi um choque. A queda de cabelo, as mudanças no corpo e os desafios do processo mexeram muito com meu psicológico, levei um tempo para aceitar e lidar bem com tudo”, lembra Gabriela. “Mas algumas escolhas foram fundamentais para tornar meu processo menos árduo, como acompanhamento com a psicóloga desde o início do tratamento. Escolher me cuidar mentalmente foi essencial para me tornar quem sou hoje. Afinal, assim como em qualquer tratamento, a cabeça comanda tudo. Se você está com a saúde mental boa, o seu corpo automaticamente também está saudável”, avalia.
Além do acompanhamento psicológico, Gabriela procurou se manter ocupada. “Acredito que tudo tem um propósito e o meu começou em 2021. No meu tratamento sempre tive dificuldade em encontrar lenços e toucas, e tive a ideia de criar uma loja virtual para vender esses adereços, e por meio da renda arrecadada, realizei um grande sonho, a criação de um projeto que ajuda crianças e adolescentes oncológicos, onde renovo minhas forças diariamente”.
Gabriela Matias também aponta a fé como importante no tratamento. “Minha base de tudo e que me mantém de pé e forte diante das adversidades. Cuidar da saúde mental e emocional é a melhor escolha que você pode fazer por si própria, estar bem mentalmente faz você enxergar positividade em meio a um cenário caótico e te faz a pessoa mais forte do mundo, pronta para encarar qualquer obstáculo”.
Jailma Bulhões fez 5 meses de quimioterapia e hormonioterapia. Em novembro, fez cirurgia conservadora da mama direita e ainda vai fazer radioterapia.
“Pratico uma atividade física da qual gosto muito, que é a musculação. Faço há muitos anos, 5 a 6 vezes por semana, não só pela estética, mas eu gosto principalmente pelo trabalho de concentração. Precisa de foco para treinar e uso isso para minha saúde psicológica. Em situações de muita pressão, me ajuda a realizar minhas tarefas, me ajuda a me concentrar”, avalia. “Costumo dizer que existe algo de que não abro mão no meu dia, que é a hora da Jailma:1 ou 2 horas na academia, fazendo musculação. Adotar um horário que faz parte da sua rotina, ajuda a conseguir socializar, conhecer outras pessoas, acompanhar o esforço e se inspirar em outras pessoas, isso cria uma série de variáveis relacionadas a sua performance”, explica.

“Quando recebi meu diagnóstico, sofri muito, chorei muito, e como paciente oncológica, a preocupação com a aparência é forte. A gente perde não só o cabelo, mas todos os pelos da sobrancelha, cílios. Você não sabe como vai reagir nesse processo e como as pessoas vão te perceber, te olhar”, lembra. “Nesse início, mesmo sofrendo, eu continuei meus treinos. Ninguém sabia o que eu estava passando, como estava a minha cabeça, continuei meus treinos concentrada em mim, naquele momento, tentando controlar minha ansiedade. Então, musculação não é só para o físico, mas é também para contribuir para a minha sanidade mental, para lidar com a doença e colocar a cabeça no lugar. Estamos lidando dia-a-dia com essa doença, que é muito traiçoeira. O importante é ficar com a cabeça bem, senão você não consegue fazer o que é preciso no tratamento”.
“Eu tenho certeza de que a musculação salvou e salva minha vida, é o meu momento de concentração em que olho para mim e me vejo trabalhando meu corpo e minha mente em meu benefício, para que eu me sinta melhor. Acredito também que a musculação me ajudou no tratamento, quase não tive efeitos colaterais. Com o diagnóstico de câncer, a gente passa meses, anos em tratamento e é preciso ter essa consciência e equilíbrio, continuar fazendo suas atividades e o que gosta, mais feliz e saudável psicologicamente, é um alivio mental”, conclui.
Fonte: Centro de Tratamento Oncológico (CTO)